Coletes amarelos: como dobrar o governo?

O discurso de Emmanuel Macron em 27 de novembro pela manhã foi uma longa e interminável provocação. Enquanto os coletes amarelos exigem, no mínimo, medidas imediatas contra o elevado custo de vida, o presidente falou, principalmente, sobre a situação do mundo até 2050. Ele não nos poupou sequer de considerações sobre “método” e “pedagogia”. Mas nem uma única medida concreta foi anunciada. A variação dos impostos de acordo com o preço do petróleo não é uma medida concreta: é uma vaga suposição, não quantificada e sem prazo de validade.

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As medidas a serem tomadas referem-se às “consultas” que serão organizadas nos próximos meses por todo o território. Claro, nada de positivo pode sair disso. Esse não é o objetivo. Nesse momento, o importante para o governo é anunciar consultas, na esperança de desmobilizar os coletes amarelos. O governo lhes dirá: “de que adianta se mobilizar, já que abriremos consultas?” [1].

No entanto, a manipulação é evidente – a quantidade de raiva acumulada é grande demais e a exasperação também – para que esse movimento se contente com promessas vagas feitas em tom erudito e arrogante. A luta continuará, no sábado, com um passo importante: a mobilização simultânea nas ruas dos coletes amarelos e da Confederação Geral do Trabalho (CGT), entre outros. Em várias cidades manifestações são anunciadas. O ideal seria que fosse assim em todos os lugares, com palavras de ordem comuns: contra a taxação dos pobres, contra as políticas de austeridade etc.

O papel dos sindicatos

Por que o governo não cede em nada? Porque ele teme, com razão, que uma concessão encoraje a luta das massas e que todos os trabalhadores então concluam: “para conseguir qualquer coisa, é preciso fazer como os coletes amarelos!” Mas, por outro lado, recusando-se a ceder a qualquer coisa, o governo corre o risco de estimular e radicalizar o movimento.

A experiência mostra que um governo é confrontado com esse tipo de alternativa quando a exasperação das massas e seu espírito de luta são tais, num país, que se está no limiar duma poderosa explosão social. Certamente, ninguém pode dizer se essa explosão – ou melhor, essa segunda explosão – ocorrerá. Porém, as condições estão criadas. E, nesse momento, a bola está nos pés do movimento operário: os sindicatos, primeiro, mas também os partidos da esquerda. Eles devem intervir nesse movimento, apoiá-lo e, acima de tudo, aproveitar seu ímpeto para construir uma ofensiva geral contra o governo Macron.

Deixado por si mesmo, o movimento dos coletes amarelos pode esgotar-se e se dispersar a longo prazo. O governo provavelmente não cederá à estratégia de bloqueios em estradas, empresas e instituições. Ele “desbloqueará”, ponto por ponto, e contará com o cansaço do movimento. É por isso que o movimento deve ampliar o seu poder e superar um limiar decisivo. A estratégia dos bloqueios deve ser encerrada e substituída pela construção de um vasto movimento de greves. Essa é a condição da vitória. Ora, nesse momento, os coletes amarelos não podem organizar por si mesmos essas greves. Esse é o papel, acima de tudo, das organizações sindicais. Elas devem colocar toda a sua força nessa batalha – não daqui a três meses, mas agora.

Em vez disso, os líderes sindicais distanciam-se dos coletes amarelos ou até mesmo os atacam – Laurent Berger, da Confederação Francesa Democrática do Trabalho (CFDT), é o mais virulento. Felizmente, a base dos sindicatos reage de maneira diferente, especialmente a da CGT, na qual a posição da sua liderança é muito contestada. E por um bom motivo: ela é escandalosa. Philippe Martinez inicialmente se recusou a apoiar as ações do dia 17 de novembro, sob o pretexto de “não desfilar com a Frente Nacional (FN)” – cuja presença organizada era, no entanto, marginal. Assim, para não convocar seus filiados para participar das manifestações de 24 de novembro, a direção da CGT convocou manifestações para o dia 1º de dezembro. Por fim, a CGT ainda não apoiou claramente a suspensão do aumento do imposto sobre combustíveis. Ela preferiu pedir um aumento de salário – como se essas duas reivindicações fossem contraditórias!

Enquanto Martinez multiplicava as desculpas para se distanciar dos coletes amarelos, as estruturas de base da CGT intervinham no movimento, ou pelo menos expressavam seu apoio. Tais aproximações devem multiplicar-se. Sempre que possível, os militantes da CGT devem propor aos coletes amarelos a organização de assembleias gerais, onde a questão da greve possa ser colocada. O movimento dos coletes amarelos pode desempenhar um papel importante na organização de um grande movimento de greves. Não será difícil conectar os dois movimentos, porque muitos dos coletes amarelos são também assalariados. Se eles forem convencidos dessa estratégia de ação, eles se tornarão excelentes defensores dessa causa em suas atividades profissionais. É preciso contar com a extraordinária combatividade que esse movimento fez emergir.

As assembleias gerais também tornarão o movimento mais democrático e mais eficaz. A escolha de oito porta-vozes – Como? Por quem? – colocou essa questão no centro das discussões. É necessário um controle democrático do movimento, da base à cúpula, com delegados eleitos e passíveis de cassação em níveis local e nacional. A propósito, isso permitiria afastar os militantes da extrema direita que buscam prosperar na desorganização do movimento. Um discurso anticapitalista claro terá muito mais sucesso com os coletes amarelos do que as lamúrias nacionalistas da extrema direita.

“Apolítico”?

Alguns dirão: “Não! O movimento dos coletes amarelos é apolítico e assim deve continuar.” E eles, frequentemente, rejeitam qualquer envolvimento dos sindicatos. Não se deve ceder a essa pressão, que sempre favorece os elementos mais à direita. Os coletes amarelos rejeitam o atual sistema político – com razão –, e desconfiam dos líderes políticos e sindicais – mais uma vez, com razão! Mas o movimento deles não é de todo “apolítico”. Algumas das reivindicações que surgem – como a dissolução da Assembleia Nacional – não são apenas muito políticas, mas também bastante radicais. E é preciso que eles encontrem uma manifestação clara na esquerda e no movimento sindical.

A CGT e a França Insubmissa (FI) , em particular, devem explicar que não será possível derrubar o governo sem um forte movimento de greves prolongadas, porque os bloqueios e as manifestações não serão suficientes. Ao mesmo tempo, devem defender um programa de ruptura com o sistema capitalista, cuja crise é a causa fundamental do alto custo de vida e de todos os sofrimentos das massas. Não intervir politicamente neste movimento seria abandoná-lo à direita e à extrema direita. Não se deve permitir isso.

[1] Esse método é bem conhecido: é sistematicamente usado contra o movimento dos trabalhadores – com a cumplicidade dos dirigentes sindicais, que constantemente dirigem as “consultas”, “cúpulas sociais” e outras “mesas redondas”.