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No Amazonas falta água, energia, UTI e testes para o coronavírus

Desde que o primeiro caso de Covid-19 foi identificado no dia 13 de março, o Amazonas já soma 229 pessoas confirmadas com o novo coronavírus. A maior parte está em Manaus, mas o interior já tem 24 pessoas diagnosticadas.


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O crescimento da doença no estado, embora menor que outros lugares do Brasil, assusta pela velocidade. Para se ter uma ideia, somente entre os dias 30 e 31 foram anunciados 24 novos casos e 2 novas mortes. No dia1º de abril, mais 25 casos surgiram e no dia 2 de abril, 29 casos. Há também seis mortes em investigação.

A situação é ainda mais preocupante devido à provável subnotificação. Os testes estão sendo feitos somente nos pacientes mais graves, enquanto hospitais públicos e particulares atendem milhares de pessoas com sintomas típicos da doença. Quem quiser ter o diagnóstico precisa pagar de seu próprio bolso em um laboratório particular.

Com a superlotação, os trabalhadores da saúde se tornam ainda mais vulneráveis ao vírus. Já são 25 casos entre eles, o que mostra as condições de trabalho e segurança a que estão submetidos os que enfrentam de frente a pandemia.

E a situação ainda deve piorar. Segundo o Ministério da Saúde, Manaus é o único município do Amazonas com UTI. Em fevereiro deste ano a cidade tinha 271 leitos, com 61% de ocupação. Destes, 177 atendem pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Isso significa que se somente 10% da população do Amazonas fosse infectada e, entre essas, 10% desenvolvessem a forma grave da doença e precisassem ser internadas, seriam necessários mais de 40 mil leitos para atender a todos. Ou seja, não há leitos para praticamente ninguém.

Os problemas de infraestrutura não se resumem à saúde. Entre os dias 22 e 24 de março, o estado passou por três apagões de energia elétrica que afetaram principalmente a região metropolitana de Manaus. A concessionária recém-privatizada colocou a culpa no linhão de Tucuruí, que conecta o Amazonas ao sistema nacional, mas não deu nenhum detalhe do que possa ter ocorrido. A causa provável é a sobrecarga devido ao aumento de pessoas trabalhando de casa.

Para completar, a falta de água que já é crônica nos bairros mais pobres de Manaus se tornou generalizada. A concessionária diz que sem energia elétrica as unidades de captação param, mas esse não é um problema novo na cidade. Enquanto o governo faz campanha para que todos lavem as mãos, milhares de pessoas não têm uma gota d’água na torneira.

A burguesia ataca

No dia 23 de março, o governador do estado decretou o fechamento de todos os estabelecimentos comerciais. Três dias depois um ofício assinado por 13 entidades patronais pedia a suspensão do decreto e a adoção da fantasiosa política de “isolamento vertical”, que na prática só salva os lucros das grandes empresas e nada faz para conter o vírus. Diante da total falta de condições do estado para combater a doença, é ainda mais risível a sugestão de que os locais de comércio tenham “pontos de verificação de temperatura e realização de testes rápidos”.

A indústria, principal atividade econômica do Amazonas, tem fábricas paradas desde fevereiro por falta de insumos fornecidos pela China. A saída encontrada pelas empresas foi dar férias coletivas antecipadas aos operários, o que é um ataque ao direito básico de descanso conquistado pelos trabalhadores.

À época o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do Amazonas (Sindmetal-AM), que também é presidente do diretório estadual do PT, disse que as férias coletivas estavam programadas desde o ano passado e que nada tinham a ver com os efeitos do coronavírus na China. Na última segunda-feira, 30 de março, mais 30 mil trabalhadores do Distrito Industrial de Manaus entraram em férias coletivas.

Segundo o sindicato, o acordo com as fábricas foi feito para prevenir a proliferação do coronavrírus, mas na prática o que acontece é que os trabalhadores são obrigados a passar suas férias em isolamento enquanto os patrões preservam seus lucros. As demissões em massa não devem demorar para acontecer e a tirar pela atuação do Sindmetal-AM nos últimos anos, que não parou nem mesmo na greve geral convocada pela CUT, central à qual é filiado, em 28 de abril de 2017, poucas ações concretas devem ser tomadas. De 2015 até hoje o Polo Industrial de Manaus já fechou 57 mil postos de trabalho.

Desde o início do projeto Zona Franca de Manaus nos anos 1960, a promessa do capitalismo de “desenvolver” a Amazônia jamais se concretizou. Se por um lado grandes indústrias estrangeiras se beneficiam há décadas dos baixos salários e incentivos fiscais oferecidos pela região, o que os trabalhadores urbanos, camponeses, ribeirinhos e povos indígenas do Amazonas ganharam foi o inchaço acelerado das periferias da capital, a destruição de ecossistemas inteiros, como no caso da hidrelétrica de Balbina, e a pressão constante pelo abandono de seus modos de vida tradicionais para compor a força de trabalho mal paga que é absorvida pela indústria, pelo comércio e pelo setor de serviços.

Abandonados à própria sorte, antigos e novos habitantes são obrigados a conviver com a escassez de infraestrutura básica, gastar horas do seu dia em um sistema de transporte público ineficiente e viver constantemente amedrontados pelas facções criminosas que disputam a rota de transporte de drogas que atravessam o estado para chegar ao Sudeste e à Europa. Dengue, tuberculose e outras doenças infectocontagiosas são endêmicas no estado. A pandemia vem apenas adicionar mais sofrimento a essa situação.

Apesar da ação derrotista das lideranças de esquerda no Amazonas, o estado tem um histórico de lutas e revoltas populares que vêm desde o Império, com a Cabanagem, até a ditadura militar. A raiva contra o sistema, que pôde ser vista em 2013 com 100 mil pessoas nas ruas da capital, precisa ser transformada em consciência de classe revolucionária para derrubar o governo Bolsonaro e aplicar todos os recursos necessários à luta contra o coronavírus.